Por: Claudecir Bianco
Teólogo e Missionário
Março/2021
Então, lhes declarou Jesus:
Chegarão os dias, nos quais, de tudo o que vede aqui não será deixada pedra sobre pedra que não seja derrubada!” Evangelho de Lucas 21.6
Neste artigo quero refletir sobre possibilidades para um mundo diferente e consequentemente, atitudes diferentes, que devem começar a partir de cada um de nós. Havia pensando em intitular este artigo como: ‘Possibilidades para um mundo novo’, mas o ‘novo’, em minha opinião não se aplica, pois tudo o que vamos conseguir são mudanças de atitudes, podendo ser melhores ou piores àquelas que até agora estamos realizando. Como criaturas, dependentes do nosso criador, não conseguiremos criar um mundo novo. E, se pararmos para refletir, nossa ‘função’ não é esta, mas sim a de sermos bons mordomos do mundo que foi criado por Deus. Claro, isso se aplica somente se você crê no Criacionismo.
No momento em que completamos um ano de pandemia, construímos uma série de reflexões, umas boas e outras terrivelmente dolorosas. No entanto, de ambas podemos retirar lições para a produção de novas práticas e atitudes que vão definir nossas concepções sobre a vida e sua forma de viver neste mundo.
Até agora, como humanidade, ainda estamos sufocando o mundo e tudo o que nele há. Extraímos, usurparmos, destruímos coisas, lugares, pessoas e animais. Parece que nada importa mais do que a necessidade de obter recursos e satisfazer nossos desejos (gananciosos).
Talvez, me arrisco escrever, que este vírus seja o resultado destas ações extremas que a humanidade vem desenvolvendo ao longo de décadas. Não seria reações de um Deus irado, que para atender à sua essência de Deus criador, aspergiria por sobre o mundo uma praga. Se bem que, teologicamente, há um campo enorme para ser explorado a partir deste contexto.
Para mim, o que estamos vivenciando é resultado natural das ações que, como humanidade, estamos realizando dia após dia, décadas após décadas, sem qualquer tipo de preocupação.
Ou seja, diante de um cenário caótico que estamos passando, surgiram várias possibilidades para mudarmos nossas atitudes, bastando apenas ter atenção em sua complexidade para assim impingir novas ações positivas.
Assim, quero destacar algumas possibilidades.
NOVAS POSSIBILIDADES PARA AGIR COM AS PESSOAS
Recente, li o artigo: “Coronavírus: como o mundo pode se curar do ‘trauma coletivo’ da pandemia de COVID-19”. O artigo aponta que este evento está sendo o primeiro desde a segunda guerra mundial em se tratando de trauma coletivo.
O trauma é um evento (complexo) que vai além de uma situação de estresse extremo. Trauma está relacionado com eventos e suas interpretações por aquele que as vive.
Ao olhar para o passado ou, se ainda, nos permitirmos ver com mais atenção casos de pessoas que estão perdendo seus familiares, vamos poder perceber que, em muitas situações, o trauma estará presente e poderá mudar completamente o curso da vida deste pessoas.
As possibilidades que vejo neste ponto é que podemos nos preparar e atuar de forma pró ativa identificando e oferendo ajudas para as pessoas que vivenciaram esta situação. Criar redes de ajudas de profissionais que possam atender pessoas com estes traumas. Oportunizar momentos de reflexões em nossas igrejas, como orações e mensagens temáticas, oferecer palestras com profissionais que possam abrir caminho para o processo de cura e restauração da pessoa.
Individualmente, podemos agir como pessoas amorosas e cuidadoras uns dos outros, chorar com quem chora, ajudar aqueles que, além da perda da pessoa querido, perdeu também os recursos na tentativa de cura.
Podemos e precisamos agir diferente do que fizemos até agora que foi ‘ficar em nosso quadrado’.
Esse momento está exigindo de nós muito mais do que ser apenas cristãos nominais que só se preocupam com sua igreja local. Precisamos parar de desviar daqueles que estão sofrendo, que estão no nosso caminho.
NOVAS POSSIBILIDADES PARA AGIR COM A SOCIEDADE
As possibilidades e oportunidades que vejo em relação à sociedade está diretamente associada à primeira argumentação relacionada às pessoas. Nós precisamos passar por processos de cura quer sejam as doenças físicas, quer sejam as emocionais que nos impedem de realizar mudanças significativas em nossa sociedade.
Como sociedade estamos padecendo de doenças crônicas. Quando não nos importamos com o lixo nas ruas, quando a falta de água só nos incomoda quando falta a água para o banho, quando desperdiçamos comida ou exageremos no consumo seja em produtos alimentares com em produtos que usamos apenas uma vez.
Enquanto os focos de incêndios na Amazônia não se importarem para mim, enquanto os deslizamentos dos morros no Rio de Janeiro somente fizer parte dos noticiários dos jornais e isso não tiver qualquer impacto na minha vida, então estou tão doente quanto a sociedade que represento.
Como indivíduos, participantes desta sociedade, podemos buscar reflexões positivas sobre nosso consumo. O quê, de fato, estamos consumindo? Estamos consumindo aquilo que precisamos, ou estamos exagerando? Sem dúvidas, esta é uma questão de foro íntimo, mas que sem dúvidas tem impactos coletivo. De onde vem os produtos que você consome? Alguma vez você já pensou em rastrear a cadeia produtiva dos produtos que você consome? Sugiro que você veja o vídeo: “A história das coisas”. Este vídeo mostra de forma muito didática a cadeia produtiva dos produtos e como a indústria tem se comportado relacionada à manutenção do consumo.
Assim, cabe a nós, fazer as melhores escolhas ou, não escolher nada mais. Nos contentarmos com o que já temos e voltar a comprar apenas quando a necessidade for real.
Também podemos refletir melhor sobre a cadeia produtiva sobre nossa alimentação. Como indivíduos, a maioria de nós, se alimenta por ‘vontade, desejo’ e não porque estamos com fome ou precisamos do alimento para permanecermos vivos.
A indústria da alimentação percebeu isso a décadas, e tem explorado esse desejo por alimentação de forma extremamente exagerada, sem controle, e totalmente antiética. A exploração dos animais para a produção de alimentos extrapolou a ‘sanidade’. O consumo de água, o desmatamento a produção recorde de grãos, fazem do mundo uma imensa indústria de alimentos que, destrói para produzir. Destrói as florestas, destrói a camada de ozônio, destrói a humanidade. Para expandir sua reflexão a este respeito, sugiro a leitura do livro: Galactolatria – mau deleite – Implicações éticas, ambientais e nutricionais do consumo de leite bovino, de Sônia T. Felipe. Neste livro você vai compreender do que a indústria é capaz e conhecerá melhor o leite que ingere. Irá conhecer o processo, o sistema de extração e a realidade da vida das vacas das quais ele é extraído. Depois, poderá refletir se esta atitude é ou não caracterizada como exploração brutal e irracional.
Mas este mau não está somente relacionado à usurpação do leite, este mau está generalizado com relação ao gado destinado para o abate. Onde foi que nos perdemos enquanto seres humanos com relação a exploração tão absurda como está? O prazer pelo consumo de proteínas animais, tem realizado modificações genéticas jamais vista pela sociedade para o consumo cada vez maior da humanidade ‘carente’ por sangue. Isso não precisa ser assim, mas só continua (e a tendência é de crescer, cada vez mais) porque a população mantém seu desejo sem refletir na produção ou na exploração. Esse está sendo um preço muito alto a se pagar.
A ‘conta’ que estamos pagando agora, decorrente do COVID-19, talvez, seja apenas a primeira parcela de uma conta impagável.
Como possibilidade para mudança, cabe uma postura individual constante, sem o desejo de que esta cadeia será revertida por completo, mas com certeza poderá sofrer um impacto muito forte, depende de cada um de nós!
NOVAS POSSIBILIDADES NA ÁREA ECONÔMICA
O mundo quebrou, economicamente falando. Muitos países, que antes da pandemia, não tinham uma estabilidade econômica razoável, estão sucumbindo na mesma proporção em que o vírus se alastra.
Outros, com suas economias estáveis, falharam em suas projeções, e estão a caminho de enfrentarem déficits que podem perduram anos. A falta de circulação da população, decorrentes do Lockdown necessários para a manutenção da vida, prejudicou o grande e o pequeno negócio, sendo este último o que mais ‘desceram à cova’.
Como possibilidades, vejo pessoas capacitadas na área de negócios e econômica, oferecendo capacitações, cursos e seminários, de enfrentamento de crises para gestão saudável do negócio, clubes de investimentos coletivos para situações emergências, criação de poupança, individual, familiar e coletivas para enfrentamento de cenários críticos.
A educação financeira nunca nos havia apresentado sua real essência como agora, quer seja individual, quer seja coletiva.
Assim, temos um belo caminho a percorrer a partir das nossas debilidades, das nossas dores e, em muitos casos, de nossas negligências.
NOVAS POSSIBILIDADES PARA SERMOS IGREJA
Esse tempo de pandemia está mostrando para nós como Igreja de Cristo, onde e como podemos ser diferentes. Com certeza, está trazendo reflexões ricas para todo o povo de Deus espalhado pela terra. Estas reflexões passam por:
‘Somos igrejas independentemente do local físico que nos reunimos!’;
‘O dinheiro é importante para a Igreja, mas para qual finalidade?’;
‘O que o próprio Senhor da igreja, espera que seus servos façam?’;
‘Qual deve ser nosso impacto na sociedade?’
Assim como você, eu tenho mais perguntas do que respostas, mas, como a intenção deste artigo é apresentar possibilidades para um mundo diferente, entendo que as questões apontadas nos tópicos anteriores estão em total alinhamento com o que a igreja pode se envolver daqui para frente, além de apenas se reunir para cultos nos finais de semana.
Como Igreja, temos um potencial imenso em nossas mãos, pois temos pessoas capacitadas em nossas congregações que muitas vezes mudam de local, porque seus dons e habilidades não são aproveitados, na esperança que em local será diferente, ledo engano.
Temos locais de encontro que podem servir de locais multiuso, oportunizando encontros presenciais (quando possível) para que pessoas da comunidade possam participar independente de sua confissão de fé.
Temos a tecnologia a nosso favor, que muitos só aprenderam porque viram a necessidade durante o caos. Outros, viram como oportunidade no passado e agora ‘colhem’ frutos mais saborosos.
Temos recursos financeiros que são coletados (semanalmente) coletivamente para que atendam às necessidades da Igreja (que são pessoas), mas que, em muitos casos recebem outros destinos.
Todas as possibilidades destacadas acima podem ser encabeçadas pela Igreja, basta que aproveitemos este tempo para traçar planos e mudar, deliberadamente e intencionalmente nosso destino. Podemos criar um mundo diferente de novas possibilidades para a Igreja, para a sociedade e para as pessoas.
Como Igreja, podemos impactar conceitos sobre religião, família, educação, governo, mídia, artes, esportes, negócios entre tantas outras áreas, de forma saudável e intencionalmente positiva.
Caso a opção seja voltar e continuar fazendo as mesmas coisas que fazíamos no passado, a conta virá do Senhor e, como diz na sua Palavra:
“… terrível coisa é cair nas mãos do Deus vivo!” Hebreus 10:31
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BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos King James – BKJ 1611 – Niterói, RJ : BV Films Editora, 2018.
[1] Leitura recomendada do artigo: Coronavírus: como o mundo pode se curar do ‘trauma coletivo’ da pandemia de covid-19