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Cada um criou um deus à sua imagem

Por: Claudecir Bianco
Teólogo e Missionário
Março/2019


Rogo-vos, pois, irmãos, pela compaixão de Deus, que apresenteis os vossos corpos em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus, que é o vosso culto racional.
E não sede conformados com este mundo, mas sede transformados pela renovação do vosso entendimento, para que experimenteis qual seja a boa, agradável, e perfeita vontade de Deus. Romanos 12:1,2

Descrevo aqui uma parábola sobre a Igreja que pode exemplificar o pensamento da presente época, que está no livro: Igreja entre aspas, de Tuco Egg.

O cara era louco. Vivia por aí falando uma porção de coisas interessantes, mas impraticáveis. Andava a esmo, não tinha onde dormir nem o que comer. Não sei se um dia teve emprego ou família.

 

Quando o conheci vagava feito um doido, ajudando pessoas carentes, fosse de comida, conselho, carinho ou abraço. Não participava de nenhuma ONG nem pertencia a algum grupo religioso.

 

Tentei falar com ele algumas vezes. Argumentar que ele precisava de apoio se quisesse promover a justiça. Evidentemente era preciso se vestir melhor, fazer a barba e usar um bom gel naqueles cabelos desgrenhados.

 

Depois disso, seria imprescindível redigir um projeto e angariar recursos. Mas não um projetinho qualquer. Era preciso sonhar, ter visão de mercado, olhar longe. Com os recursos na mão poderia promover cursos, palestras e congressos, alugar grandes teatros, compor música, montar uma banda, fazer shows e ter uma sede própria de onde pudesse comandar tudo.

 

Estrutura física é importantíssima quando se quer promover algo verdadeiramente grandioso e com um bom investimento em um ambiente agradável, climatizado e bem projetado, ele iria longe. As pessoas lotariam o grande salão da sede de sua empresa. Viriam aos milhares. Ele poderia organizar as palestras em vários turnos, vários dias por semana. Poderia também criar uma série de outros eventos dirigidos aos mais variados públicos, para manter todos os seus seguidores ocupados e perto de si.

 

Insisti com ele sobre isso mais de uma vez, mas ele nunca me deu ouvidos. Acabou sozinho, pobre, esquecido. Foi morto por alguns desafetos.

 

Mas eu fiz meu projeto baseado em suas ideias e obtive todo sucesso que ele jamais sonhou. Cito seu nome com frequência; ele merece os créditos. Evidentemente cuido para que ninguém se sinta obrigado a segui-lo de verdade. Basta que me sigam. Basta que participem das palestras e eventos que promovo. E os que me seguem têm a nítida sensação de estarem seguindo aquele mártir.

 

Temos uma parceria. Ele não a aprovaria, mas eu sei que assim funciona melhor. Eu perpetuo seu nome e ele me dá sucesso. (EGG, 2011. p.102-103)

Seria cômico se não fosse trágico! Seria apenas uma parábola, se não fosse comprovação prática de algumas ‘instituições’ modernas.

Corro o risco de ser mal interpretado, mas ao mesmo tempo tenho dificuldade para ‘me amoldar ao padrão deste mundo’ e entender como ‘normal’ algo que Biblicamente não é.

Sobre a presente época, que molda nossa sociedade não é difícil de entender os conceitos da Pós-Modernidade. Perceber que a Igreja está inserida num mundo marcado pelo rompimento, que é confrontada a todos os instantes para ‘quebrar tabus’, aceitar de braços abertos a nova moralidade, estabelecer para si novos critérios de padrões éticos e ser conduzida a viver de forma pouco ortodoxa, me deixa desconfortável.

Nos conceitos da Pós-Modernidade, a verdade é totalmente relativizada, não há verdade absoluta. Você interpreta da forma como fica melhor para você. Você deve estar confortável. Na Pós-Modernidade, não existe um único caminho.

Numa releitura, o texto de João 14.6, que diz: ‘Eu sou o caminho, a verdade e a vida’, nos tempos de hoje poderia ser escrito assim:

 Talvez eu seja um caminho, uma verdade, uma vida’.

A geração Pós-Moderna moldou um deus para si. Cada um ‘criou’ um deus à sua imagem e à sua semelhança’! Um deus paternalista, assistencialista que está disponível somente quando necessário. Sem conteúdo, sem profundidade, sem cruz…

Uma espiritualidade que prega e se agrada mais do céu, que não teme o inferno, pois este é relativo, o primeiro, é para todos.

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BÍBLIA. Português. Bíblia de Estudos de Genebra – São Paulo: Cultura Cristã e Sociedade Bíblica do Brasil, 1999.

Egg, Tuco. Igreja entre aspas. Editora Grafar. Joinville/SC. 2011.

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